Lucas e Laura: duas histórias no contexto da educação inclusiva

CARTA DO PAULO CÉSAR:

Caros amigos:

Gostaria de expor o caso de um pequeno ser humano que tem me deixado angustiado pela política maldosa de nosso país.
Lucas,7 anos, tem tudo para ser uma criança dita normal, inteligente, esperta feliz. é realmente o que disse.
Estudou 8 mese no Instituto Benjamin Constant aprendendo rapidamente o Braille até a letra T. Os pais desciam as 4 da manhã para chegar cedo no Instituto.
Por motivos financeiros eles decidiram que o pequeno Lucas deviria estudar em Paracambi. A escola especial onde o Lucas ou melhor a turma que ele está incerido é de alunos com deficiência mental e caderante com deficiência mental maiores de 21 anos.
Questionei aos pais porque eles não tentaram o internato para ele. Disseram então que não tinham confiança em deixar o filho deles no INstituto por motivos de terem ouvido muitas histórias negativas sobre a segurança dos alunos.
Argumentei de todas as formas mas eles acham que o Lucas ficará melhor aquí. O quadro é o seguinte.
O pequeno Lucas está nesta turma, a professora não sabe Braille o que estou tentando fazer como a melhor saída, é transferi lo para uma turma regular.
Acho que os coleguinhas da idade dele será de extrema importância para ele. Nesta idade as crianças não percebem o diferente, agem mais naturammente.
Neste meio tempo, tenho lido em Braille com ele, levei meu sorobâ, meus jogos, como dama, xadrez, estou tentando comprar uma bola de futebol jáque le gosta de jogar bola.
Meu cargo no município é de fonoaudiólogo, mas consegui uma vez p por vez semana ficar com o Lucas até onde puder.
Espero contar com a ajuda dos amigos.
Cada vez mais me irrita estes falsos gestores, tecnocratas, burocratas, não pensam no ser humano, não tem sencibilidade para resolver as situações, impurram de um lado para outro.
Nestes anos todos que tenho participado nos movimentos de cegos a nível nacionalme decepcionei com nossos dirigentes ao assumir um cargo esquecem que nós somos pessoas privilegiadas, e por isto devemos ser autênticos transparentes e sensíveis.
Desculpem o meu desabafo.

Nome: Paulo Cesar da Silva
Profissão”: Fonoaudiólogo/psicopedagogo
Endereço:Rua João Batista Fialho Rosa nº 68/Bairro: São Lourenço
Cidade: Engenheiro Paulo de Frontin Estado do Rio de Janeiro/Brasil
Cep: 26650.000
Tel:55-24-2463-1098 Celular:55-24-9958-3737
Email: pcesar2002@bol.com.br

CARTA DA ROSANGELA:

Prezado Paulo Cezar ,

antes de qualquer coisa queria parabenizá-lo pela sua solidariedade em dispor-se a encontrar caminhos para o pequeno Lucas . Certamente uma missão que será muito gratificante e fundamental para a vida desse garotinho.

A minha filha de 5 anos , que é cega e estuda numa escola regular desde os 2 anos e meio, também conhece todo o alfabeto braile e já está lendo várias palavras .
Ao matriculá-la a diretora foi logo me avisando que nunca tivera um aluno cego antes e eu também lhe confidenciei que também nunca tinha tido uma filha cega antes.
Eu poderia lhe dizer o que já sabia e nós e a escola poderiamos aprender juntas o que ainda não tínhamos descoberto .
E foi assim, tudo que se ensinava as outras crianças , também se ensinava a Laura , seus desenhos eram feitos com materiais em alto relevo, os personagens das histórias viravam bonecos que toda turma adorava pegar , brincar de massinha, amassar, rasgar e cortar papel , aprender música, rima, poesia, dançar, pular , ouvir história , direita, esquerda, emcima, embaixo, pra frente, pra trás , etc,etc,etc …
até chegar a hora de aprender o braile muito ainda uma criança cega precisava aprender , exatamente tudo o que precisa as demais crianças antes que a ela as letras fosse apresentadas .
E foi essa a primeira lição que a escola regular aprendeu com a sua primeira aluna cega …
O que a escola especial ensinaria diferente ?
E então chegou a hora do braile , foi quando as crianças começaram a entrar mais profundamente nas letras , as crianças ainda tinham 4 anos e o movimento já era intenso em torno das letras. Bom, percebi que a professora da minha filha ” pescava ” as letras em braile toda vez que precisava escrever algo porque tinha fixado um alfabeto enorme ao redor das paredes da sala junto com o alfabeto em tinta .
Um dia vi escrito numa parede o nome de todas as crianças em braile e algumas letras não estavam corretas . Fui a diretora e gentilmente lhe falei que o braile precisava ser de dominio antecipado da professora que fosse assumir a turma onde a Laura fosse estar para que incidentes como aqueles não continuassem acontecendo, porque sinceramente , perguntei a ela : ” voce contrataria uma professora que não soubesse o alfabeto ?
Pois é , então no caso do braile tem que haver o mesmo rigor, porque afinal é através desse código que voces irão alfabetizar a minha filha .
” Então propus reuniões semanais para estudar braile com as professoras . Todas , exatamente todas da escola quiseram participar e em apenas um mês , mostrando as estratégias que usei para aprender e com a ajuda daquele programa da usp, em CD , não precisávamos mais dessas reuniões .
Embora , considere esta escola um exemplo a ser seguido no que tange o seu compromisso sério com a inclusão escolar, tive que fazer muitas intervenções , como por exemplo quando o dever de casa não vinha com nenhuma pista tátil, nenhuma referencia para
que em casa , como as demais crianças que dizem o que a professora falou na sala , a Laura pudesse me explicar o dever , então mandava uma cartinha para a professora e dizia a ela que o dever da laura era para ela uma folha em branco e que a ela não poderia ser negado a possibilidade de que aprendesse a explicar o dever de casa , falar no portão sobre o mesmo para quem ia lhe buscar na escola, não era nem de longe dar-lhe a mesma oportunidade que a seus colegas.
Depois disso, a professora gastava um pouco mais do seu tempo com o dever de casa , e por aí foi e por aí vai , este ano a nova professora que aprendeu o braile o ano passado está muito motivada e estamos todos muito felizes com a alegria da Laura em ir para a escola . Ano passado, conhecemos a Mariana, mora na zona rural, 30Km da cidade , cega , estuda também na zona rural, sua professora não lhe ensina nada segundo a mãe porque ” tem medo de lhe ensinar errado”, a menina está lá para socializar .
A mãe por sua vez não acha que ela já poderia usar o talher sozinha, muito menos o vaso sanitário, porque aos 4 anos , apenas porque é cega , ficava nas fraldas , também ainda levava mamadeira para escola , e a cabeça constantemente baixa .
Fui lá na escola da Mariana junto com uma professora da escola da laura , levamos as atividades , a professora falou, eu falei. A Mariana veio aqui em casa e passamos uma tarde juntas .
A mãe da Mariana viu a minha filha tirar toda a roupa sozinha e entrar para o chuveiro, a viu usar o vaso, viu que ela não ficava de cabeça baixa .
Á Laura e a Mariana falamos sobre suas deficiencias , diferenças, respondemos as perguntas delas .
Uma semana depois a mãe da Mariana me liga dizendo que a escola mudou o comportamento completamente , estavam tratando ela como as outras crianças e parecem que tinha perdido o medo de lhe ensinar alguma coisa , até participando da rodinha ela estava, coisa que não fazia antes .
E agora em dezembro a mãe voltou a me ligar para dizer que a mariana também não usava mais fraldas e que também mamadeira só para dormir .
Combinamos das professoras da mariana virem a escola da minha filha agora no inicio do ano, estamos esperando.
A inclusão escolar definitivamente não é um capricho de pais que não aceitam a deficiencia de seus filhos, a inclusão escolar é antes de tudo necessária porque a educação especial tão benéfica quanto apontam alguns não chegará a todos os lugares , não chega .
Quantos Lucas e Marianas não têm acesso a ela e a mais nada também ? Não seria mais fácil levar professores as escolas ? E não seria mais fácil levar conhecimento aos pofessores ?
Crianças cegas , surdas, cadeirantes, com deficiencia intelectual, não precisam de outras crianças com deficiencia para crescerem saudaveis e felizes, precisam ser amadas, ser aceitas, ser respeitadas , onde estiverem e com quem estiverem .
Precisam de oportunidades , porque é a falta delas , todos sabemos sso, que faz a deficiencia da Mariana e do Lucas terem sobre eles efeitos diferentes daqueles que tem sobre a minha filha .
Na escola da Laura , a coleguinha obesa não queria ir para escola durante uma semana porque disseram que ” barrigão ” não entra .
A outra colega em casa finge que é cega imitando a Laura , a mãe a repreende e ela responde : ” a Laura não acha ruim que ela é cega .”
Crianças não precisam ser protegidas da vida, da verdade , da realidade , tem que aprender a lidar com problemas, se na escola há o preconceito, é para isso que estão lá os professores, para lidar com eles,
então vamos colocar obesos, negros, etc, todos numa sala para que crescam não se sentindo inferiores ?
E quando crescerem , tudo vai ser diferente ? Vai ser sim, bem pior, porque não aprenderam a lidar com isso quando pequenos, com suas diferenças, suas limitações , não sabem reconhecer seu talentos e encontrar o equilibrio.
A escola também é para ajudar a mostrar isso .
A escola especial ainda é necessária, excetuando-se situações extremas , porque ainda não temos na escola regular , a inclusão responsavel e comprometida que reinvindicamos .
Porque ainda são gigantescas as barreiras de atitude , o professor não vê a pessoa, o aluno com deficiencia, como um ser humano como outro qualquer, ainda ver a deficiencia na frente do sujeito, e isso muda toda a perspectiva do seu ato de ensinar .
A escola regular se diz não preparada e nao faz nada para preparar-se , a escola especial lamentavelmente também não se prepara para fazer parcerias com a escola regular , e se fecha em argumentos que não são condizentes com a situação atual vivida no mundo inteiro , as novas tecnologias, o avanço nas leis internacionais de direitos humanos, tudo gira em torno da universalidade dos serviços, dos espaços , e a escola faz parte disso .
Não faz sentido escolas especiais , porque a vida é uma só, lazer, trabalho, universidades , as pessoas vão se encontrar lá na frente , porque não vão se encontrar desde crianças, adolescentes?
Eu sei , sei que têm mil argumentos contra tudo que descrevi, a experiencia pessoal de voces, o fato de eu ter condições de colocar minha filha numa escola particular, de ter informação, etc,etc, mas tenho a consciencia tranquila de que falo também pelas marianas e Lucas desse Brasil, que longe de informação , de escolas especiais , sofrem com mais pungencia a limitação imposta pela deficiencia.
E como disse , lamento que determinados segmentos da educação especial no Brasil não tentem articular maneiras de fazer parcerias com o professor da escola regular , desmistificando certos temas e sendo para a escola uma fonte de informação .
E ao contrário disto, fazem questão de afirmar que este é um processo que não dará certo e etc.
E sabe para quem não dará ? Para as crianças que não tem pais conhecedores dos seus direitos, com capacidade de argumentação, e que como o pai do Lucas que não podem continuar acordando as 4 da madruga para levá-lo ao IBC , o deixam na primeira escola especial que encontrarem no caminho porque não consideram o seu filho capaz de estudar com outros colegas, e a escola regular sem apoio, sem suporte, sem rede de informação , não assume uma criança para a qual não se preparou , ou melhor , a deficiencia para a qual se preparou , porque o Lucas , apenas o Lucas é um garoto como outro qualquer , mas ….se voce Paulo Cezar não conseguir convencê-los disso, será muito dificil que a inclusão do Lucas seja bem sucedida. Desejo que voce e o Lucas consigam .
Enfim, desculpem por ter falado pelos cotovelos…

Rosangela